Renata Carvalho desabafa no Festival de Curitiba
Em coletiva , ela detalhou trajetória depois de ter sido expulsa de casa
“Por que eu tô aqui? Quase morrendo? Quase morri algumas vezes e a arte sempre me salvou. A minha vida como uma pessoa travesti também foi violenta”. O desabafo da atriz, diretora e ativista Renata Carvalho, aconteceu na última terça-feira (26), em entrevista coletiva no Hotel Mabu, em Curitiba.
A artista contou o caminho até chegar na criação do “Manifesto Transpofágico”, espetáculo que integra a Mostra Lúcia Camargo, apresentado no 32º Festival de Curitiba. A entrevista foi marcada por relatos emocionantes da história de vida, carregada de resistência e de quem, depois de anos de tentativa, teve a oportunidade de subir nos palcos de todo o Brasil e também em alguns países da Europa.
A ativista trouxe esses depoimentos à imprensa, contando como foi passar por tudo isso sendo uma pessoa travesti. Ela também relembrou que viveu períodos de ameaças de morte e ataques, que a fizeram ficar sem expectativas de sair de casa e tampouco de viver.
A situação aconteceu em decorrência de algumas apresentações da peça “O evangelho segundo Jesus, rainha do céu”. Após sofrer perseguição, a atriz disse que passou anos em confinamento e que, muitas vezes, normalizou tais comportamentos. “Era ameaçada de morte todos os dias, chegou uma hora que eu naturalizei e então não saía de casa mesmo. Você não sai para não morrer”, explicou.
Em meio a todo preconceito e ódio escancarado, a atriz continuou a luta pelo direito de estar no palco. Depois da estreia do “Manifesto Transpofágico”, ela percebeu que dava pra viver sem ser atacada e ameaçada. Nesse novo momento, Renata Carvalho passou a se ver à frente da situação, bem como se enxergou viva e criativa ao construir depois dos 35 anos. “É importante a gente sonhar porque eu não me via mais velha e isso é uma mudança estrutural na nossa comunidade”, ressaltou.
A atriz comentou também sobre ser rotulada como uma artista polêmica e violenta, críticas que mostravam o quanto ela raramente era acolhida. Isso mudou ao encontrar o diretor teatral Luiz Fernando Marques, com quem atualmente trabalha. Renata aproveitou a oportunidade para elogiá-lo publicamente. “Já admirava ele e foi um diretor que me segurou no colo, teve o cuidado, carinho e amor necessário que eu precisava para esse trabalho”, agradeceu.
Com toda a sua história de luta e resistência, Renata Carvalho finalizou a coletiva reforçando a importância das narrativas colocarem, por exemplo, travestis e pessoas negras em lugares de destaque e, assim, provocar reflexões em toda a estrutura social. Na visão da artista, essa é uma dos efeitos da arte. “Se cada um mudar o seu mundinho e ficar bom, vamos nos encontrar”, frisou.
O espaço foi tomado pelo impacto das falas de Renata. Depois de ter vontades arrancadas em sua trajetória, ela hoje enxerga outras possibilidades e tem muita vontade de viver. A atriz olhou para janela e refletiu em voz alta, ao olhar o movimento da praça Santos Andrade: é preciso curtir todas essas coisas, pois a vida é maravilhosa.
Informações: Jade Domingues, da Universidade Positivo